Amamentar não é "coisa de pobre", é coisa de mamífero
- Camila Mendes
- 10 de nov. de 2015
- 4 min de leitura
Moça, hoje eu tive a infelicidade de ver seu texto rolando pelas páginas alheias. Me perdoe o teor da palavra, mas eu achei de uma ignorância tremenda o que você postou. E para a ignorância, só existe um remédio: a luz da ciência. E rebaterei com fatos, as falácias que você comentou.

Amamentar não é coisa de pobre ou rico. É coisa de mamífero. É instinto. Você fazendo veterinária deve saber do que eu digo.
“O leite humano atende perfeitamente às necessidades dos lactentes, sendo, muito mais do que um conjunto de nutrientes, um alimento vivo e dinâmico por conter substâncias com atividades protetoras e imunomoduladoras. Ele não apenas proporciona proteção contra infecções e alergias como também estimula o desenvolvimento do sistema imunológico e a maturação do sistema digestório e neurológico” (SBP, 2012)
Mamadeira/fraldinha não é bom senso. É infelizmente, um consenso tomado por uma sociedade por vezes machista, que erotiza o peito. Segundo Lima (2013), a erotização do seio é fenômeno recente na cultura ocidental, visto que este antes era tido como fonte de alimentação. Os principais determinantes entre a maneira como o seio é ou não ligado à sexualidade são o meio, a cultura e a sociedade, assim como podem erotizar o corpo feminino.
Segundo a OMS, a Sociedade Brasileira de Pediatria e a SPSP, o aleitamento materno deve ser oferecido até os 2 anos, NO MÍNIMO. Outro dado importante: até os 12 meses, o principal alimento para o bebê é o leite materno. Outros alimentos são apenas complementos.
“A Sociedade Brasileira de Pediatria (SBP) adota a recomendação da Organização Mundial da Saúde (OMS) e do Ministério da Saúde (MS) para que se recomende o aleitamento materno exclusivo até os 6 meses de idade. A partir desse período está indicada a introdução da alimentação complementar e deve-se estimular a manutenção do aleitamento materno até os 2 anos de idade ou mais, de acordo com vontade da mãe e da criança” (SBP,2012).
A livre demanda, é estipulada pelo binômio mãe-bebê (lembra daquela brincadeira de sexta série: a conversa é entre A e B, (vo)Cê tá fora? - é, então.). E ainda, segundo a SBP, o bebê deve mamar todas as vezes em que quiser, sem horários fixos ou determinados. Deu vontade, voilà.
Acho que você já sabe que mulheres não se transformam em vacas, né? Somos de espécies diferentes. Eu pelo menos sou.
O governo estimula sim o aleitamento materno. E você quase acertou! Mas não é pensando no cálculo de latas x filhos x dinheiro empregado, é pensando na redução da taxa de mortalidade infantil, já que desde a década de 70 se sabe do aumento da morbimortalidade infantil associada ao uso de fórmulas lácteas infantis adaptadas. Também pensando na diminuição dos casos de diarreia e desnutrição, assim como de depressão pós parto, já que aumenta o vínculo entre mãe e filho, melhora a relação sono-vigilia, atenua a resposta do cortisol ao estresse (FIGUEIREDO, 2013). Ou do risco de sensibilização às proteínas do leite de vaca, já que segundo Solé (2002), o uso desenfreado de fórmulas lácteas adaptadas e o desmame precoce das crianças, têm sido os principais responsáveis pelo aumento da incidência de intolerância a proteínas do leite de vaca (APLV). E o governo sabe que órgãos competentes e publicações mundiais desenvolvem, ano após ano, pesquisas sobre a importância do leite materno, para diversas questões, dentre elas, o aumento do QI, da imunidade, do vínculo, do estímulo a sabores diferentes, a saciedade, que futuramente impedirá a criança de desenvolver DM e obesidade (OPAS, 2007) - " o mamar mais fácil na mamadeira" tem seus contras também, cherie.
“Crianças e adolescentes que nunca receberam aleitamento materno têm maior ocorrência de obesidade na idade escolar”(Siqueira e Monteiro, 2012).
A amamentação é apontada como um fator determinante para o desenvolvimento craniofacial adequado, por promover intenso exercício da musculatura orofacial, estimulando favoravelmente as funções da respiração, deglutição, mastigação e fonação. Sendo assim, a mamadeira pode dificultar o amadurecimento da musculatura orofacial. Em estudos, os grupos que usam de meios de sucção, como mamadeira, ou mamadeira e chupeta, apresentaram maior frequência de mordida aberta anterior (BALDRIGUI et al, 2001).
Ainda temos o problema da procedência das mamadeiras, feitas de plástico que podem deslocar componentes para a fórmula, quando submetida a temperatura alta. Um destes é o bisfenol-A, que pode contaminar o alimento. Segundo a ANVISA, o limite de (0,06mg/kg) não afeta a saúde, porem a SBP alega não haver níveis seguros dessa substância. Hoje em dia, existem produtos no mercado BPA-FREE, devendo haver um controle rígido dos órgãos fiscalizadores (SOUZA, 2015).
E sabe o que você leva pra qualquer lugar, sem se preocupar se azedou, sem esquentar no microondas na mamadeira cheia de bisfenol? PEITO!

Ilustração por Raquel Thomé.
Fontes:
Baldrigui et al. A importância do aleitamento natural na prevenção de alterações miofaciais e ortodônticas. Rev.Dental Press Ortod Ortop Facial. 2001
Figueiredo B et al. Breastfeeding and postpartum depression: state of the art review. Jornal de Pediatria. Rio de Janeiro, 2013;
Gradim. Aleitamento Materno como Fator de proteção para o Câncer de Mama, Fortaleza, 2011;
Lima et Al. Percepção Materna sobre o apoio recebido para a amamentação: o olhar na perspectiva da vulnerabilidade programática. Londrina, 2013;
Manual de Orientação do Departamento de Nutrologia. SBP, Rio de Janeiro, 2012;
Siqueira e Monteiro. Amamentação e obesidade na idade escolar. Revista de Saúde Pública, São Paulo, 2007;
Solé. Editorial da revista brasileira de alergia e imunopatologia. Disponível no site: <http://www.pirineus.ind.br/leitedecabra/pagina22.htm>.Acessado em 10/03/2002.
Souza, Líria Alves De. "Bisfenol: perigo presente em mamadeiras"; Brasil Escola. Disponível em <http://www.brasilescola.com/saude/bisfenol-perigo-presente-mamadeiras.htm>. Acesso em 04 de novembro de 2015.
Organização Panamericana de Saúde. Além da sobrevivência: práticas integradas de atenção ao parto, benéficas para nutrição e a saúde de mães e crianças. Washington, D.C.: OPAS; 2007.
*Revisado por Elisa Guimarães.
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