A violência obstétrica nossa de cada dia
- Wanda Karine Santana
- 24 de set. de 2015
- 3 min de leitura

Ilustração por Raquel Thomé
Segundo o Ministério Público do Estado de São Paulo, a violência obstétrica pode ser identificada durante a gestação, no momento do parto - que inclui o trabalho de parto, o parto em si e o pós-parto - e no atendimento de complicações de abortamento.
Este assunto veio à baila há pouco tempo. Não se falava nas agruras sofridas por mulheres gestantes e parturientes, sobretudo as mulheres pobres, usuárias do Sistema Único de Saúde (SUS). Mas, engana-se quem pensa que isto é exclusividade da população mais vulnerável.
Como citado na cartilha do Ministério Público do Estado de São Paulo, a violência obstétrica praticada durante a gestação é caracterizada pela negligência no atendimento à mulher, nas ofensas e humilhações praticadas pela equipe de saúde e no agendamento de cesáreas sem indicação. O excesso desse procedimento no Brasil é praticado, sobretudo, por médicos de planos de saúde. O que faz com que o trabalho seja drasticamente reduzido a uma cesárea, que dura em média vinte minutos, ao invés de realizar o acompanhamento durante todo o trabalho de parto e sua dinâmica, que pode levar muitas horas. Cesáreas sem indicação colaboram para a ocorrência de riscos tanto para a mulher quanto para o bebê.
O alto índice de cesáreas no Brasil levou o Governo Federal a tomar medidas para reduzir o número deste procedimento, que ocorre em torno de 85% na rede conveniada e particular, contrário ao que recomenda a Organização Mundial da Saúde (OMS).
Um momento crucial para a mulher, o trabalho de parto, no qual se preconiza a presença de um acompanhante, à escolha da mulher, é totalmente negligenciada.A parturiente, quando na sala de pré-parto, encontra-se sozinha, impedida de deambular, conectada a um monitor cardiofetal e à infusão de ocitocina, para estimular as contrações, sem nenhum conforto físico e psicológico, enfrentado dores extremas. O excesso de toques vaginais, justificados pelos profissionais como sendo imprescindíveis para a verificação da dilatação do colo uterino, é outro ato agressivo extremamente invasivo e, por vezes, doloroso. No ápice dessas dores, quando algumas chegam a gritar, vem a conhecida frase “na hora de fazer não gritou!”, ou “não grite, assim assusta outras mães!”. Raramente se faz a analgesia correta, como eu mesma pude vivenciar, no parto do meu primeiro filho. O que tive foi uma injeção intramuscular de meia ampola de Dolantina com meia de Fenergan, que me fazia desmaiar no intervalo das contrações, e fizeram meu filho nascer praticamente dopado.
Outra agressão, comumente praticada é a realização da episiotomia. Uma incisão, justificada para que haja aumento da abertura vaginal para a saída do bebê, causa de lesões irrecuperáveis, cujos danos ultrapassam os aspectos físicos da mulher. Não é raro ver mulheres com infecção dessas incisões, lesões permanentes de nervos e até mesmo lacerações graves e fístulas retovaginais, trazendo grande dano psicológico.
Também é qualificado como violência obstétrica aquelas praticadas por profissionais da saúde às mulheres em complicações por abortamento, que vão desde a humilhação e constrangimento até demora ou negação ao atendimento. Com a ocorrência de ameaças e coação por parte da equipe, alegando este ser crime e passível de denúncia, sendo o abortamento intencional ou acidental.
É estimado que uma a cada quatro mulheres já sofreram violência obstétrica, e a maioria delas sequer cogitava que estes maus tratos se caracterizavam como uma violação.
Independente de onde a mulher busque o atendimento durante a gestação, parto ou em caso de abortamento, ela tem direito a um atendimento humanizado, eficiente e isento de opiniões ou crenças pessoais. O impedimento às condições de dignidade, como maus-tratos, constrangimento, impedir a presença de um acompanhante e a realização de procedimentos desnecessários ou sem o consentimento da mulher é violência obstétrica.
Em caso de ocorrência, o Ministério Público do Estado de São Paulo recomenda que se exija a cópia de seu prontuário médico na instituição de saúde, e procure a Defensoria Pública. Outro meio de fazer denúncias é pelo telefone 180 (Violência contra a Mulher) e 136 (Disque Saúde).
Revisado por Natália Moura
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