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Por Mais Mães e Crianças no Feminismo

  • por Adauana Campos
  • 10 de jan. de 2015
  • 5 min de leitura

Vou falar como mãe. Não quero falar sobre teorias, vertentes e linhas filosóficas feministas. Apenas quero tentar dizer como se sente uma mãe.


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Começo a dizer que mães são mulheres silenciadas duas vezes: uma por serem mulheres, outra por serem mães.


A mãe é aquela mulher que a sociedade patriarcal vende como privilegiada. Mãe é o ser romantizado pela sociedade, sempre sorrindo em propagandas de eletrodomésticos que ela “ama” ganhar no dia das mães. Ela tem a benção divina de gerar e parir com dores um bebê. E também de abrir mão de sua vida, seus sonhos, seus desejos, seu trabalho, estudos, ter jornada dupla, por vezes criar um filho sozinha... Ela deve arcar com as despesas desse “privilégio” sozinha, afinal, se não quisesse, não “abriria as pernas”, ou “tinha se cuidado”. E com essas frases culpabilizadoras e misóginas as mães seguem suas vidas.


Considero toda mãe uma mulher forte e guerreira. Mas há mães que querem desconstruir a socialização feminina, ou seja, a forma como elas foram criadas desde o nascimento e, claro, repassar isso a seus filhos. Até porque é mais fácil construir um ser humano do que desconstruir um cheio de ignorâncias e preconceitos.


Quando a mulher não aceita o isolamento social e político que a maternidade lhe condiciona e decide militar, com quem ficam os filhos?


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Sabemos que a sociedade machista e patriarcal já decidiu isso há séculos. A criação dos filhos é de total responsabilidade das mães. E muitas vezes por serem as mães as responsáveis pela educação e socialização das crianças, quão importante é uma mãe ser feminista? Quantas de vocês, moças, que estão lendo esse texto agora, não gostariam que suas mães fossem imponderadas para se libertarem de relacionamentos abusivos, terem uma autoestima blindada contra gaslightning e não sofressem slut shaming.

Mas pode haver um obstáculo que pode fazer toda a diferença entre uma mãe se aproximar ou não do feminismo.


Ao se aproximar de ambientes e coletivos feministas, sejam eles presenciais ou não, a mulher precisa se sentir acolhida, segura e representada. Com a mãe não é diferente. Mas estar em um lugar onde há muita antipatia com a sua condição de mãe não é lá muito legal. Não é incomum escutar ou ler a frase “EU ODEIO CRIANÇAS”. Não me lembro quantas vezes eu escutei e/ou li essa frase e, em todas as vezes, ela me machucou e ofendeu. Sorte que eu estava amadurecida no feminismo a primeira vez que vi feministas dizerem isso.


Sabemos que crianças estão longe de serem santas e que elas podem, sim, ser bem irritantes. Acreditem, nós mães sabemos disso. Para nós que somos adultas, é fácil entender que não devemos chorar ou gritar em público. Mas crianças são seres em construção e estão aprendendo tudo, inclusive isso. Crianças não são robôs, não seguem protocolos sociais. Se nem nós muitas vezes seguimos, por que cobrar isso delas, logo tão cedo?


Não estou defendendo que crianças não devam ser ensinadas a se comportarem em determinados ambientes ou que não devam seguir e obedecer a certas regras de convívio social, mas sabemos que esse não é um processo rápido e nem mágico. Não existe o botão “criança se comporte” no filho de ninguém. Talvez se lembrar de como você era quando criança e perguntar aos seus pais suas travessuras te ajudem a entender e a ter empatia em momentos que a criança te “irrita” – pois afinal você já foi uma criança.


Sabe quantas vezes eu cheguei de festas, eventos ou reuniões sociais com dor de cabeça? Inúmeras vezes. Mas não por ter bebido, quem dera, mas por ter ficado sempre alerta, por medo de minhas filhas aprontarem ou incomodarem as pessoas presentes naquele local. Sabe o aperto no peito que é ter que chegar em um ambiente já pedindo desculpas por algo que suas filhas podem vir a fazer? O pavor do julgamento alheio não me permite ficar a vontade em ambientes onde eu deveria estar descontraída e relaxada. “Ah, mas por que levou as meninas?” Porque eu não tenho onde deixar. Ou elas vão ou eu não saio! Não é uma escolha, essa é a minha condição.


Agora imaginem um ambiente feminista que não é acolhedor para uma criança. Se não acolhe a criança, logo não vai acolher a mãe também.


Muitas vezes a mãe não tem creche para deixar a criança, o pai não é presente e a família não a apoia. A família pode ser só a mãe e o filho, então dizer “EU ODEIO CRIANÇAS” faz com que essa mãe seja marginalizada e excluída de um ambiente que, no mínimo, deveria ser acolhedor para todas as mulheres. Inclusive para as mães. Mães são mulheres estigmatizadas e exaustas, silenciadas, também precisam ser acolhidas no feminismo.


E jura que nunca passou pela cabeça de vocês que uma criança com comportamento agressivo pode estar refletindo o ambiente hostil em que vive? E que essa mãe pode estar precisando muito mais de ajuda do que nós imaginamos? Afinal, os números de mulheres que sofrem violência doméstica no Brasil são alarmantes. E vale lembrar que violência doméstica atinge as crianças também. Sofrem mãe e filhos, juntos.


Aborto seguro, maternidade compulsória, violência doméstica contra mães e seus filhos, pedofilia... são todas estas pautas feministas. Pautas fortes e pesadas, porém mais do que necessárias, pois tudo isso acontece diariamente no mundo. Difícil não conhecer alguém que nunca tenha passado por isso, ou até mesmo, não se reconhecer nisso.


Crianças já tem no mundo pessoas que não as querem. Muitas vezes essas pessoas são os próprios pais. No feminismo será assim também? Mesmo que você não queira ter filhos, isso não te isenta de apoiar as mães.


Quando a mãe se afasta de um ambiente feminista, além dela não ser acolhida, não se acolhe a criança também. Crianças são seres racionais e que aprendem muito rápido. São despidas de preconceito e devem ser muito bem vindas em ambientes feministas. Crianças também têm medos e dúvidas, são seres em construção. Não sabemos sua orientação sexual ou sua identidade de gênero. Logo, ter crianças acolhidas em ambientes feministas é somatório não só para o movimento, mas para a sociedade como um todo.


Outra coisa que não posso deixar passar é que vejo muito mais preocupação quando se fala “EU ODEIO HOMENS, do que na frase “EU ODEIO CRIANÇAS”.


Por exemplo, qual é a reação quando se diz “I HATE MEN”? "Nossa, mas você ta exagerando, não pode ser tão radical assim, meu namorado, meu marido não são assim, not all men...” E quando mulheres dizem “Eu odeio crianças”? "Cri, cri, cri...”


O motivo de existirem mulheres misândricas é porque homens estupram, assediam, humilham e matam. E por qual motivo existem pessoas, mulheres, mulheres feministas que odeiem crianças? Ela puxou o seu cabelo e monopolizou a sua TV assistindo Galinha Pintadinha? Pense nisso!


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E pra finalizar, esse pensamento anti-criança de moças que se dizem feministas em um país em que o aborto não é só proibido, mas criminalizado, é no mínimo contraditório e preconceituoso. Visto que ser mãe, na maioria das vezes, não é uma escolha, é compulsório.


Empatia e sororidade são para as mães e seus filhos também. Se a criança não é bem vinda em um ambiente feminista, logo a mãe também não o é.















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